FOTO DO ALMOÇO ANUAL

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A VELHA MALTA

sexta-feira, 29 de abril de 2011

CONTO

(Eu e o Dr. Varela Pires)


DIGO-TE AMANHÃ

Por João Brito Sousa

Eram 23 horas de sábado. Pedrito tinha-se divorciado havia duas semanas e estava sozinho. Sentia as necessidades fisiológicas normais num adulto e sentiu o desejo de encontrar uma companheira, num jogo sério e limpo. Encontrou na net uma forma de comunicar, um anúncio com nº de telefone e email, senhora de cinquenta e cinco anos, procurava amizade no sexo oposto. Pedrito pegou no telemóvel e ligou para o número que constava no anúncio. Veio uma voz feminina que atendeu, atenciosa e melódica e travou-se um dialogo amigo, que durou mais ou menos uma hora, o que, vindo do zero em conhecimentos pessoais, foi brilhante.
- Mas eu posso estar aí amanhã às doze horas, disse Pedrito
- Ok, cá o espero.
E assim foi. Às 12 horas do dia seguinte, Pedrito estava defronte da porta de saída da estação do caminho de ferro do destino e pouco depois chegou a senhora num mais ou menos luxuoso Mercedes Benz. A porta abriu-se e Pedrito entrou, descontraidamente ou mais ou menos e a senhora cumprimentou-o com cortesia e educação. Duas horas depois de um dialogo interessante a senhora disse; estou a gostar muito de estar consigo. E Pedrito agradeceu e sorriu numa expressão que só ele entendia.
Pedrito também achava que sim, que o dialogo tinha sido bom, mas de suas experiências anteriores teria efeitos positivos, o máximo oito dias, depois as coisas esfriavam e desaparecia tudo, sem que Pedrito soubesse porquê. Neste encontro, as coisas ainda não tinham dado sinais de fragilidade, mas Pedrito receava que isso acontecesse.
Já amaste alguém, perguntou-lhe Pedrito.
A senhora respondeu e dessa resposta, seguiu-se um dialogo interessantíssimo e tocaram-se em pontos, tabus há muito pouco tempo.
A que horas é o comboio de regresso? Não podes ficar? perguntou ela.
Sim, ficava, disse Pedrito. .Mas onde? perguntou.
Ela sorriu. E disse. É melhor que vás hoje.
Mais conversa e boa disposição e, quando já estava na estação dos caminhos de ferro, Pedrito ligou para ela e disse.
O comboio está na linha. Gostava de ficar. O que é que dizes, perguntou Pedrito.
Foram segundos ligeiramente angustiantes que deram ainda para dizer sim, não, sim, não… fica, que eu já passo aí, disse ela.
E assim foi.
Nesse resto de tarde andaram por todo o lado, tendo ela convidado, inclusivamente, Pedrito a ir sua casa. E Pedrito foi e até se sentou no sofá da sala. E ela também se sentou no sofá ao lado.
Pedrito disse, chega-te mais para cá, estás muito longe.
Ela sorriu e disse, está bem assim, deixa estar.
E ele, vamos descansar um pouco?
E ela, fazendo cara de caso, Pedriiiiiiiiiito.
E ele, ok.
Saíram para jantar e Pedrito conduziu a conversa para a literatura
Sabia que eu escrevo? Perguntou ele.
Sim, vi no seu cv lá no clube, disse ela. E perguntou-lhe, como se chega a escritor?
Boa pergunta, com é que se chega, perguntou vc e muito bem. Por que escritores nem todos são, apesar de se insinuarem. Um escritor vai sendo E só o tempo vai dizer se tem talento. Se o escritor não for esquecido e tem mercado, esse indicador é favorável e quem tiver estes atributos, poderá ter direito a ser considerado escritor. Sommerset Maugham foi um dos poucos que eu saiba, que disse, este é o meu primeiro livro e eu considero-me escritor.
E foi um grande romancista, confirmou ela.
Um escritor precisa de se preparar, escrevendo. É como o atleta que vai aos Jogos Olímpicos, tem de se reparar, treinando, disse Pedrito. E mais, se se sentir a necessidade de escrever, mais positivo se torna para quem disso beneficia na sua afirmação como escritor, disse ainda.
E deve começar por onde? indagou ela.
António Lobo Antunes, escritor português consagrado, disse no Brasil, que os iniciados na escrita deviam ver jogar à bola, apenas durante dez minutos, o Mané Garrincha, porque, o futebol que Garrrincha jogava, vinha da alma. E um candidato a escritor tem de perceber essa expressão, vem da alma, disse Pedrito.
Estou verdadeiramente encantada contigo, disse ela.
Vais comigo até ao Hotel? Descansamos lá um pouco, disse Pedrito.
Não, vamos ao supermercado, disse ela e sorriu.
Estavam bem dispostos, ambos, mas no seu interior, Pedrito, não se sentindo derrotado também não se sentia um vencedor, digamos, que a garrafa de whisky estava meio vazia. E disse.
A tua opinião sobre o amor, perguntou.
O amor, é um resultado biológico natural que nos surge e que nos pode proporcionar um bem estar desejável, disse ela.
O que surge primeiro, o amor ou sexo? Perguntou ele.
O sexo sem amor é uma coisa feia. O amor é um sentimento belo; o sexo, sem amor, é deplorável. Primeiro sentimos a necessidade de aproximar os corpos e sentir que o outro tem algo para nos dar. O amor é dar e receber. Com força. A força aqui é a intensidade recebida dos afectos. O parceiro terá de ser terno e meigo..Cinco minutos abraçados no silêncio das tardes, pode ser maravilhoso, fantástico mesmo, fascinante até. Daqui resultará prática sexual ou não. Poderá não haver, disse ela.
É importante que haja, disse Pedrito.
Depende, o importante é o amor, disse ela.
Amaste e foste amada, perguntou Pedrito.
Nem tanto, disse ela. E tu?
Não amei nem fui amado, disse Pedrito, porque não descortinei a fronteira entre o sexo e o amor. Há muitos homens que não sabem isso, disse Pedrito.
Acredito, disse ela.
A tarde estava serena e na atmosfera sentia-se uma certa melodia e encanto. Estavam à porta do Hotel e Pedrito arriscou.
Vamos fazer amor?
E ela, fixando-o com o seu olhar no olhar dele, depois de alguns segundos de espera, pegando-lhe na mão, disse-lhe.
DIGO-TE AMANHÃ

JBS

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